O DESEQUILÍBRIO SILENCIOSO ENTRE EMPRESAS E PROFISSIONAIS DE MARKETING

Em um cenário de aparente abundância de profissionais e vagas, o que se vê, na prática, é um descompasso inquietante.

Diariamente, recebo solicitações de empresas em busca de profissionais de marketing: analistas, estrategistas, gestores de tráfego. Quase na mesma proporção, recebo mensagens de profissionais à procura de oportunidades. Ainda assim, as indicações são escassas. Não por ausência de vagas ou talentos, mas por uma desconexão estrutural entre expectativa, preparo e valorização.

Neste artigo, trago uma análise crítica e embasada sobre o desequilíbrio atual no mercado de marketing. O objetivo não é apenas refletir, mas provocar um ajuste de rota nas formas como empresas contratam e profissionais se posicionam.

Um mercado onde vagas e talentos não se encontram

De acordo com a pesquisa “Tendências de Recrutamento 2024”, realizada pela Robert Half, 64% dos líderes empresariais brasileiros afirmam ter dificuldades em contratar profissionais de marketing para cargos estratégicos. Ao mesmo tempo, observa-se um aumento de 23% no número de profissionais da área ativos no LinkedIn, buscando recolocação.

Não se trata de escassez. O problema está na falta de alinhamento entre escopo, remuneração, perfil e expectativa. Muitas empresas buscam profissionais sêniores, mas oferecem salários operacionais. Outras contratam pela urgência, e não pela aderência ao desafio estratégico. O resultado é previsível: rotatividade elevada, projetos estagnados e frustração generalizada.

Vagas mal estruturadas perpetuam o ciclo de frustração

Um erro recorrente no setor é a formulação imprecisa de vagas. É comum encontrar descrições que misturam funções táticas com responsabilidades estratégicas, exigem múltiplas competências, mas não entregam clareza de objetivos, autonomia ou ambiente propício à performance.

Essa abordagem genérica afasta profissionais qualificados, atrai perfis incompatíveis e, muitas vezes, gera contratações baseadas apenas na adequação orçamentária. A consequência é a baixa efetividade da área, desgaste interno e perda de competitividade.

Marketing não se limita a ferramentas. É pensamento, contexto e visão

O marketing atual não pode ser confundido com operação de ferramentas. Embora o domínio técnico seja necessário, ele não substitui a inteligência estratégica, a capacidade analítica e a compreensão profunda do comportamento humano e da lógica dos negócios.

Segundo estudo da McKinsey & Company, publicado em 2023, empresas que integram o marketing à tomada de decisão estratégica crescem até 2,5 vezes mais do que aquelas que tratam o setor apenas como apoio operacional. Mesmo assim, ainda há uma cultura corporativa resistente à valorização real dessa competência.

A desvalorização crônica e a evasão de talentos

Outro dado relevante, extraído do relatório “Futuro do Trabalho 2023” do LinkedIn, aponta que 32% dos profissionais com formação em marketing migraram para outras áreas nos primeiros cinco anos de carreira. A principal razão mencionada foi a falta de valorização do papel estratégico da área dentro das empresas.

Isso revela um problema estrutural. Profissionais bem formados estão deixando o setor por não encontrarem ambiente favorável ao crescimento, enquanto empresas continuam enfrentando dificuldades para preencher posições críticas.

A responsabilidade também está do lado dos profissionais

Embora o cenário corporativo precise amadurecer, é preciso reconhecer que muitos profissionais também ainda não compreenderam plenamente seu papel. O marketing de impacto exige mais do que executar. Exige saber interpretar dados, conectar pontos, entender negócios, refinar narrativas e construir diferenciação.

Não basta dominar ferramentas. É necessário ter repertório, pensamento crítico, leitura de mercado, escuta ativa e capacidade de traduzir desafios em soluções. Profissionais que desejam protagonismo precisam investir em profundidade, consistência e inteligência de longo prazo.

A verdadeira urgência está no alinhamento

Há vagas. Há talentos. Mas ainda falta maturidade na forma como essas duas pontas se conectam. O mercado de marketing não está saturado. Está desajustado. E até que esse ajuste aconteça, seguiremos repetindo o ciclo da escassez artificial.

A mudança começa com consciência. Empresas que tratam pessoas como custo colhem instabilidade. Empresas que tratam pessoas como estratégia colhem resultados.