
Seguir o que todo mundo faz nunca foi estratégia. Negócios que se destacam e sobrevivem ao imediatismo são aqueles que colocam intenção e pensamento estratégico no centro das decisões de marketing.
A evolução do marketing como ciência do comportamento de consumo e da construção de marcas acompanha transformações profundas no mercado e nos hábitos dos consumidores. No entanto, a recente popularização do marketing digital, impulsionada por um discurso superficial e comercialmente conveniente, resultou em um fenômeno preocupante: a banalização da disciplina.
O que antes era fundamentado em inteligência de mercado, conhecimento teórico e acadêmico, modelagem de comportamento e diferenciação estratégica, foi reduzido a fórmulas genéricas amplamente disseminadas por profissionais sem formação ou experiência consolidada.
Este artigo busca restabelecer o papel do marketing estratégico como um campo de estudo sólido e indispensável para organizações que desejam não apenas crescer, mas garantir relevância e longevidade em mercados cada vez mais saturados.
A partir de uma análise crítica, são explorados três aspectos fundamentais:
- A inadequação dos modelos convencionais de conversão
- A limitação da diferenciação funcional
- A urgência de resgatar a inteligência competitiva como fator estratégico indispensável
Fragilidade dos modelos convencionais de conversão
O conceito tradicional de funil de vendas, amplamente adotado no planejamento estratégico das empresas, foi originalmente estruturado por Strong (1925) e posteriormente aprimorado por Kotler (1999), consolidando a ideia de que o consumidor passa por um processo sequencial e previsível desde o primeiro contato até a decisão de compra. No entanto, pesquisas recentes demonstram que esse modelo é insuficiente para explicar a dinâmica do mercado contemporâneo.
Estudos do Ehrenberg-Bass Institute for Marketing Science (Sharp, 2010) evidenciam que a decisão de compra raramente ocorre de maneira linear e que a fidelidade à marca é, em grande parte, um reflexo da disponibilidade mental e física dos produtos e serviços.
Em outras palavras, marcas que estruturam suas estratégias exclusivamente com base no modelo de funil tradicional estão negligenciando um fator crítico: a forma como a recorrência de exposição e a construção de memória influenciam a conversão.
O comportamento do consumidor moderno não é mais ditado por uma progressão linear. Com a multiplicidade de canais e a fragmentação da atenção, a jornada de compra ocorre em padrões caóticos, sendo influenciada por variáveis contextuais e experiências intermitentes.
A abordagem estratégica, portanto, precisa considerar a modelagem de consumo baseada em comportamento probabilístico, no qual a conversão não é uma consequência de etapas bem definidas, mas sim de um processo contínuo de reconhecimento e ressignificação da marca na mente do consumidor.
Ilusão da diferenciação funcional e o colapso da relevância
Empresas tradicionalmente buscam a diferenciação como forma de agregar valor e justificar a precificação de seus produtos e serviços. Entretanto, a diferenciação funcional, outrora um pilar do marketing estratégico, tem demonstrado eficácia reduzida em mercados saturados e hipercompetitivos.
Segundo Kapferer (2012), a diferenciação é um conceito volátil, pois, em grande parte dos setores, os diferenciais competitivos podem ser copiados com facilidade, reduzindo sua longevidade como vantagem estratégica.
O erro comum das organizações é investir na comunicação de atributos específicos do produto ou serviço sem construir uma percepção de marca que transcenda esses elementos.
Marcas como Apple, Tesla e Nike não são líderes de mercado apenas porque seus produtos possuem características técnicas superiores, mas porque estabeleceram uma presença psicológica dominante.
A construção de identidade e a consistência de posicionamento geram diferenciação perceptiva, que não está atrelada apenas a atributos concretos, mas à maneira como a marca é internalizada pelo consumidor.
Empresas que continuam a investir apenas em diferenciação funcional ignoram que a fidelidade do consumidor não é uma questão de superioridade técnica, mas de conexão emocional e disponibilidade mental.
Como demonstrado por Ritson (2021), marcas que se tornam culturalmente relevantes mantêm um posicionamento inabalável mesmo diante da concorrência agressiva, pois sua proposta de valor se sustenta na percepção — e não apenas na oferta tangível.
Urgência da inteligência competitiva como pilar estratégico
A banalização do marketing resultou na proliferação de abordagens genéricas que desconsideram um dos pilares fundamentais da disciplina: a inteligência competitiva.
Em um ambiente mercadológico volátil, no qual mudanças tecnológicas e comportamentais ocorrem em ciclos cada vez mais curtos, a ausência de um modelo de análise robusto coloca as empresas em risco de obsolescência estratégica.
A inteligência competitiva não se trata apenas de coletar dados de mercado, mas de interpretá-los e traduzi-los em ações concretas que garantam vantagem sustentável.
Segundo Porter (1985), a vantagem competitiva surge quando a organização consegue integrar suas capacidades internas com um entendimento aprofundado do ambiente externo, criando um diferencial que não pode ser replicado facilmente.
Empresas que ainda baseiam suas decisões de marketing apenas em métricas operacionais – como engajamento em redes sociais e alcance de anúncios – estão negligenciando um aspecto crítico: o real impacto dessas ações na estrutura de percepção do consumidor e no ciclo de vida da marca.
O foco excessivo em indicadores de curto prazo leva a uma visão distorcida do desempenho, resultando em investimentos mal direcionados e estratégias que não sustentam crescimento de longo prazo.
Reflexão final… Será?
O marketing estratégico não pode ser reduzido a modelos estáticos e metodologias ultrapassadas. A adaptação ao comportamento caótico do consumidor, a transição da diferenciação funcional para a diferenciação perceptiva e a incorporação da inteligência competitiva são fatores indispensáveis para a construção de marcas fortes e sustentáveis.
Empresas que continuarem a investir em abordagens baseadas em fórmulas genéricas correm o risco de perder relevância e serem absorvidas pelo ruído do mercado.
O verdadeiro marketing estratégico exige pensamento crítico, análise profunda e um compromisso com a construção de valor real, e não apenas com a replicação de modelos superficiais.
A pergunta que permanece é: sua estratégia de marketing está preparando sua marca para o futuro ou apenas sustentando sua sobrevivência no presente?
Se sua marca projeta crescer com consistência e relevância…
…é hora de abandonar os atalhos e investir em estratégia real. O marketing deixou de ser sobre o que você diz e passou a ser sobre o que você constrói na mente e na memória do consumidor.